E o NIF 9999... ou o email "naotem@naotem...?
- Pedro Gomes
- 17 de jun.
- 4 min de leitura
Garbage In Garbage Out (GIGO) é um conceito simples, mas profundamente revelador no âmbito da gestão de dados e processos comerciais: se introduzirmos dados incorretos ou incompletos, os resultados que obteremos também serão incorretos ou pouco confiáveis.
Este conceito encontra especial relevância nas organizações que procuram excelência através do Modelo Compromissus, onde a qualidade da informação é uma variável central para garantir uma gestão consistente e resultados sustentáveis.
Na prática diária, o Garbage In manifesta-se frequentemente pela imposição de campos obrigatórios como o Número de Identificação Fiscal (NIF) ou o email. Estes campos são cruciais para processos internos e externos, mas quando não há informação disponível, muitas vezes induzem à introdução de dados fictícios apenas para prosseguir com o registo.
Uma situação real ocorreu durante a implementação do CRM GAPS num cliente nosso, que inicialmente tinha uma base com mais de 50 mil entidades. Após análise cuidada, percebeu-se que uma percentagem significativa dessas entidades apresentava NIFs repetidos como "999999999" ou emails fictícios como "naotem@naotem.pt". Este cenário impedia qualquer possibilidade realista de contacto ou análise estratégica rigorosa, gerando uma enorme ineficiência na gestão dos dados.
Outro exemplo prático ocorre frequentemente quando uma nova fatura entra automaticamente no CRM vinda do sistema de faturação.
Imagine-se uma situação em que o número de telemóvel do cliente coincide com uma entidade já existente no CRM, mas que infelizmente está registada com um NIF "999999999" e um email "naotem@naotem.pt". Ao mesmo tempo, o email real deste mesmo cliente está registado noutra entidade, dificultando assim a identificação clara e correta da entidade certa para esta nova fatura.
Esta multiplicidade de registos gera um caos organizacional e impossibilita uma gestão eficaz dos processos de comunicação e faturação.
Numa operação de CRM, como por exemplo uma campanha específica dirigida a um determinado segmento de clientes, o problema dos dados inválidos torna-se crítico.
Uma equipa que pretenda iniciar esta operação irá deparar-se com entidades repetidas, números de telefone inexistentes ou incorrectos e emails claramente fictícios.
Este cenário não só cria desperdício de recursos, como também impacta negativamente a eficácia e o retorno das campanhas realizadas.
Igualmente significativo é o impacto sobre a liderança organizacional. Imaginemos um diretor que pretende analisar as novas entidades registadas no CRM para avaliar o potencial futuro do negócio. Contudo, ao verificar os registos, percebe rapidamente que muitas dessas novas entidades apresentam dados inventados, criando um cenário ilusório sem valor real ou estratégico. Esta situação impede uma análise rigorosa e limita gravemente a capacidade de decisão informada.
Algumas empresas, para limitar o lixo e a entropia das informações, restringem a inserção de dados a apenas algumas pessoas dentro da organização, permitindo que registem apenas os clientes que efetivamente compram e geram fatura.
Esta estratégia aparentemente benéfica esconde um ponto crítico essencial: a grande maioria das entidades com quem a empresa interage não chega a adquirir produtos ou serviços imediatamente.
Desta forma, perde-se um enorme potencial estratégico, pois muitas oportunidades de negócio futuro e relacionamentos valiosos ficam completamente fora dos registos oficiais da empresa, fazendo com que esse "ouro" passe despercebido e se perca irremediavelmente.
É neste ponto que a importância da heterorregulação – a regulação definida pela própria organização através de processos claros e transparentes – entra em acção. Esta regulação cria os alicerces necessários para que cada colaborador compreenda a importância do rigor na introdução dos dados.
Contudo, para que este sistema realmente funcione, é fundamental uma outra componente: a autorregulação. Esta última ocorre quando cada membro da equipa, consciente da relevância do seu papel na organização, assume a responsabilidade pessoal de garantir a qualidade da informação que introduz.
Neste contexto, a liderança desempenha um papel central e transformador.
Líderes presentes, conscientes e comprometidos são capazes de promover e incentivar práticas de rigor e transparência nas equipas. Estes líderes não se limitam a estabelecer normas; eles criam rotinas claras, oferecem formação constante e garantem uma comunicação aberta sobre a importância da qualidade dos dados. A liderança pelo exemplo e a criação de rotinas claras e transparentes são práticas valorizadas no Modelo Compromissus, sendo essenciais para garantir uma cultura organizacional alinhada com a qualidade e responsabilidade.
Felizmente, para muitas empresas, esta problemática já pertence ao passado. Estas organizações ultrapassaram a fase inicial de resistência e compreenderam plenamente o valor estratégico da qualidade dos dados. Estas empresas possuem bases rigorosas e consistentes que permitem análises detalhadas, fundamentadas e alinhadas com os seus objetivos estratégicos.
Contudo, ainda encontramos muitas outras organizações que continuam a enfrentar desafios significativos relacionados com a qualidade dos dados. Estas organizações, muitas vezes, ainda registam apenas os clientes que efetivamente adquiriram produtos ou serviços, negligenciando potenciais negócios futuros e limitando drasticamente a sua capacidade estratégica.
Refletir sobre Garbage In Garbage Out, no contexto do Modelo Compromissus, é perceber que o verdadeiro desafio não está apenas em sistemas ou tecnologia, mas em pessoas, cultura organizacional e liderança. Ao investir na formação contínua, na implementação de práticas transparentes e na criação de rotinas consistentes, é possível garantir que a informação se torne um verdadeiro ativo estratégico para a empresa, contribuindo decisivamente para o seu crescimento sustentado e duradouro.
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